sexta-feira, 13 de março de 2009

Bon Chic Bon Genre - BCBG

Há mais de vinte anos foi publicado em Paris, da autoria de Thierry Mantoux, o grande sucesso BCBG - Le guide du bon chic bon genre .
A sigla ficou associada à imagem do bom-tom da classe média-alta ou até da alta sociedade mais discreta.
As normas do BCBG distinguem a aristocracia, a burguesia e os novos­-ricos.
Obras parecidas com esta surgiram nos Estados Unidos e em Inglaterra, respectivamente com os nomes de Preppy e Sloane Ranger.Outros sucessos.
Numa época em que as modas mudam rapidamente, estes conceitos continuam a pro­jectar curiosa actualidade.
A boa performance dos BCBG recorda sempre o passado, a família, a casa, as boas maneiras, o ar ou o look, como já dizia Mantoux.
No ambiente social, os BCBG estão ligados à nobreza e à história de família. Dão muita importância aos nascimentos, às vidas das crianças, aos verdes anos. Seguem entusiasticamente os preparativos para os casamentos: como casam, onde casam, a festa, a viagem de núpcias e a posterior vida social. A decoração da casa, as profissões, os carros, os jantares, as festas à noite, os desportos que praticam. Tudo é retratado com observação divertida e adequada. Todos os tiques, os des­portos de elite - jogging, caça, ski, golfe, cavalos, ténis e bar­cos , a televisão que vêem, os jornais que lêem. Como passam a meia-idade, até aos últimos anos das suas vidas e os enterros que fazem.
Heranças, religião e êxito são tópicos muito desen­volvidos. Por último, o livro oferece um teste para os interessa­dos se avaliarem como pertencentes ao clã BCBG. A interna­cionalização dos estilos de vida, e o acesso aos mesmos meios, bens e serviços, fez chegar até nós este padrão. Conhece-se o passado, herdam-se criados, mobílias, tradições. Cultiva-se a patine. Apesar da vulgarização dos divórcios, o casamento é preservado ao máximo e as famílias são, em grande parte, nu­merosas.
Vive-se em bairros tradicionais nos centros das cida­des, em velhas casas ou em grandes quintas nas periferias.
Usam-se as boas maneiras como bandeira, o velho espírito de servir e dar exemplo de boa educação, simples e sem pre­tensões. Nem muito cerimoniosos nem descontraídos, expres­sam-se em termos simplificados.
A sua imagem é clássica: o vestidinho preto, colar de pérolas, saia pelo joelho, lenço Her­mès, relógio Cartier, sapatos Scarpin.
Os homens, de fato e gravata, não se dá por eles; blazer, calças beges ou cinzentas, sapatos engraxados, meias escuras, altas, nó da gravata bem puxado. Têm no armário smoking para bailes de debutantes ou bodas de oiro dos avós. Fraques, às vezes herdados, para os casamentos.
Elas têm um penteado discreto, raramente mudam de estilo. Pintam-se pouco. Usam carteiras sem marca ou talvez velhas Vuitton. Usam blazer com saia travada; e as mais novas usam kilt, com camisolas de caxemira.
As crianças vestem kilts, calções de flanela, blazer. As gabardines são Bur­berry. As meninas têm vestidinhos, e eles calções de veludo para festas dos primos e colegas. O cabelo delas é cortado a direito, o deles à rapazinho. Vão à missa na paróquia.
São ca­tólicos praticantes e participam em festas de caridade. Muitas senhoras dedicam-se ao trabalho voluntário para ajudar po­bres, doentes ou velhinhos.
O círculo de amigos é restrito, convivem aos fins-de-se­mana em casas de campo. Fazem viagens com casais amigos e, no regresso, fazem jantares para mostrar fotografias e recor­dar bons momentos.
As crianças frequentam colégios de freiras ou padres e continuam os estudos nas Universidades católicas. Não exi­bem marcas nas roupas. Só as já referidas.
Os carros preferi­dos são os Mercedes, carrinhas, já bastante usadas.
Não fre­quentam as festas dos famosos e poucos são conhecidos no jet set mundano. Tratam-se por você, são simpáticos mas distan­tes com o pessoal doméstico. Gostam de ter na sala, por cima da lareira, um retrato da dona da casa, rodeada dos filhos, feito por um pintor da moda.
Eles são quadros de empresas ou têm profissões liberais. Elas começam a trabalhar tardia­mente, depois dos filhos criados. Não têm discurso feminista. Se podem, ficam em casa a tomar conta dos filhos.
Usam anel de brasão se pertencem à nobreza. Têm papel impresso para cartas, cartões e envelopes. Tem-se o culto dos bebés. Quando nascem são baptizados com nomes antigos e simples, ao terceiro ou ao quarto mês de vida. Convida-se a família e o padre para um almoço ou lanche em casa. Dão-se presentes religiosos. O enxoval é à antiga, mas aceitam-se acessórios modernos. Recorrem a baby-sitters quando neces­sário. Na escola, restringem os grupos, cultivam amizades em ambientes fechados e convidam-se entre si para festas de anos. Praticam desportos desde pequenos, tratam os pais por pai e mãe e nunca por tu. Os adolescentes usam t-shirts, ténis e ieans lavados mas muito gastos. Frequentam discotecas que se tornam moda mas mudam os destinos com frequência. São lançadores de tendências, comunicam por telemóvel e Internet em chats restritos. Têm carro quando entram na Universidade.
Têm namoros dentro do mesmo grupo, o que é apreciado pelos pais. Concluídos os estudos, os tios ajudam a arranjar emprego em bons lugares. Vem o casamento, na sequência de um namoro, já à moderna, sem chaperon.
O casamento é uma festa paga pelos pais da noiva em casas de família dela. Muito convencional. O padre assiste à festa. A lua-de-mel é muito democrática; os destinos são os de toda a gente, o Atlântico Sul. Vêm os filhos e repetem-se as cenas.
As senhoras mais ve­lhas, além de caridade, vão a chás-canasta. Vestem clássico. Eles jogam golfe e, se são ricos, dedicam-se à caça com os amigos do grupo. Fazem vida de casa, mas também vão a con­certos e cinemas. Não são vistos em público aos fins-de-se­mana. Têm segundas casas ou quintas antigas. Os mais novos vão para a neve no Inverno.
Esta classe, que se assume anti­-burguesa, acaba por ser referência e padrão dos burgueses, que precisam de referências para se actualizar. Intelectual­mente sem rasgos, pois são convencionais, não colocam nem impõem ideologias. Representam uma estética social, invejável para muitos, irritante para outros.

in Socialíssimo, Paula Bobone

1 comentário:

  1. Nunca fui atrás da ccrítica dácil, negativa ou positiva. Descobri o seu espaço por mero acaso.
    Acabei de ler este post e só agora percebi a dinâmica do burguesismo, da estética e do bom gosto. Para além de bem escrito e estruturado, o texto é uma lição de história social. Perdi-me neste hino ao bom gosto. Obviamente sigo-a! Obviamente vou ficar!

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